A maior transferência de património de sempre
em três, dois, um…
A maior transferência de património de sempre em três, dois, um…
Já não falta assim tanto para que a uma das maiores transferências de património de sempre tenha lugar. Uma passagem de dinheiro entre gerações - e eventualmente com o salto de uma geração pelo meio - que irá exigir dos serviços de banca privada maior capacidade de atuação, mas sobretudo maior conhecimento de um tipo de cliente que não é agora o seu. O que se espera destes novos clientes, mas também de quem os irá servir?
Os diretores de banca privada presentes no primeiro encontro do Think Tank da BNY Investments têm noção de que o cliente que hoje servem não será o mesmo que eles (ou outros profissionais) irão servir daqui a alguns anos. Trata-se de clientes de uma geração distinta, com hábitos e comportamentos diferentes, que irão exigir, naturalmente, um serviço também ele diferenciado. A necessidade (ou não) de um serviço de relação e o que estes clientes realmente valorizarão, foram temas abordados na conversa.
Cientes de que os millennials serão a geração vindoura que mais vai herdar património nos próximos anos, os profissionais acreditam que estes clientes poderão ser capazes de valorizar, por exemplo, o pagamento de aconselhamento financeiro independente. “Se pensarmos nas novas gerações, podemos concluir que estas poderão estar mais predispostas a aceitar este tipo de serviço do que as gerações mais antigas”, acredita Bruno Minoya Perez.
O alargamento da esperança média de vida afeta o tema em causa, pois a maior transferência de património da história está mesmo aí à porta, como relembra Pedro Lobo. “A riqueza acumulada nunca foi tão grande, e vai saltar uma geração na hora da transmissão. São os millennials que a vão receber”, assinala. Contudo, para o profissional, algumas decisões legislativas - como é o caso da RIS - poderão ter impacto no tema. Isto porque poderá estar em cima da mesa uma mudança de modelos de negócio, que culminem no corte de determinados canais nos quais os bancos deixam de conseguir ter retorno. “São esses canais que precisamente os millennials mais procuram, e acabamos por estar perante um possível contrassenso entre o caminho do negócio e aquilo que esses clientes vão procurar”.
Millennials: vão valorizar a componente de relação?
Uma das questões em cima da mesa é se os millennials serão, ou não, apreciadores da relação que normalmente um private banker estabelece com o seu cliente. Na opinião de António Luna Vaz, aqui entra em jogo, também, a própria particularidade do mercado nacional. “Não sabemos se os millennials apreciam ou não a relação tradicional de private banking. Mas sabemos que o mercado latino é muito diferente do mercado norte-europeu ou norte-americano”, começa por dizer. Da sua experiência, denota “que em Portugal ainda existe pouca preocupação genérica em preparar antecipadamente a passagem de património”.
Da sua experiência, denota que em Portugal ainda existe pouca preocupação genérica em preparar antecipadamente a passagem de património. “Não há, genericamente, uma consciencialização de duas coisas: herdeiros serão sempre herdeiros, e a passagem de património irá inevitavelmente acontecer no futuro. Provavelmente, com o aging da população, irá saltar uma geração…”. “No BPI temos vindo a desenvolver um percurso de conhecimento e de início de desenvolvimento de relação para começar a conhecer os herdeiros. Só assim teremos a resposta se valorizarão ou não a relação”, reporta.
Para Ana Nobre, a verdade é que esse trabalho já está em marcha. “Nós já fazemos a parte de relação geracional, obviamente para assegurar a continuidade geracional no património. Ao banco compete e formação e informação. Mas estamos proibidos de qualquer aconselhamento fiscal. Aquilo que nos compete a nós, é conhecer os herdeiros, acompanhá-los e assegurar uma transição de património eficiente e, se necessário, fazer eventos de literacia financeira, e assim dotá-los dos mínimos olímpicos de conhecimento sobre mercados financeiros”, refere.
Ver o value for money
Na perspetiva de Bruno Minoya Perez também entra na equação o facto de as novas gerações serem mais informadas. Nesse sentido, e para lá da importância da relação, acredita que está também a avaliação que farão do benefício que tiram do serviço. “Os millennials têm que percecionar o value for the money”. No seu entende, “as novas gerações têm uma consciencialização e uma familiaridade com os mercados financeiros muito maior do que as gerações anteriores”, e “portanto, estão menos dependentes do conselheiro financeiro”. Nesse sentido, o Banco Carregosa lançou a NEXTGen Academy no formato de workshops, que visa aproximar do banco, as novas gerações herdeiras do património, dando a conhecer a importância da poupança e da gestão dos investimentos, assim como conhecer os seus verdadeiros interesses. “A importância e a capacidade de prestar um serviço de consultoria independente serão determinantes”, revela, “com o advisor a ter obrigatoriamente que ser uma pessoa muito mais bem preparada, com muito mais certificações”.
António Luna Vaz concorda com o referido. “Acho que esta geração tem uma maior consciencialização do pagamento de serviço. Há muito mais gente dessa geração que está disposta a pagar. Pagam pela Netflix pelo Revolut, por exemplo. Só que pagam por aquilo que valorizam. O trabalho está em tornar os serviços cada vez mais valorizados”, afirma. Deste modo, na indústria de wealth management o profissional acredita que a relação terá sempre que existir. “Mesmo uma pessoa que esteja nesta área e tenha conhecimentos sólidos de mercados financeiros, se herdar, vai querer ouvir a opinião de terceiros; vai querer apoio em consolidação, em aconselhamento patrimonial, fiscal, imobiliário, etc. Daí o sucesso crescente, por exemplo, de estruturas de family office, que são estruturas que fazem aconselhamento a profissionais e a ultra high net worth individuals”.
Para Ana Nobre, outro ponto importante é também os custos que servir esta geração terá para as entidades. Tratando-se os millennials de “uma geração muitíssimo mais predisposta a temas ESG e muitíssimo mais digitalizada e, acima de tudo mais informada, tal traduzir-se-á, irremediavelmente, num custo superior para o serviço de Private Banking. Isso é algo preocupante”, aponta.
Talvez a pergunta seja: que tipo relação vão valorizar?
Parece ser consenso entre os participantes que a relação não deixará de existir e ser importante para as gerações mais novas que receberão património. Para Pedro Lobo a questão prende-se mais com o tipo de relação que estes intervenientes vão valorizar. Neste caminho, antecipa alguns cenários. Acredita que esses herdeiros vão “valorizar bastante a informação” e, por isso, as entidades terão que se adaptar “para serem muito mais um marketplace do que um estruturador da oferta”. “Vamos ter que investir no valor acrescentado da análise, da recomendação da informação e muito menos na estruturação da oferta do produto. Temos que ter as ferramentas e os canais, para termos um marketplace mais ágil, digital, fácil de adquirir, e investir no valor acrescentado”, alerta.